segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Eleições ( II )

  •             Deparo-me com editorial do jornal "O Globo", denominado "fundamentalismo nas eleições", quando saúda o candidato José Serra porque "agiu de maneira correta o ministro da Saúde José Serra quando, em 1998, contra a ação deste mesmo lobby ( grupos religiosos conservadores ) que se movimenta na campanha, emitiu nota técnica ao SUS para regular a curetagem em mulheres vítimas de estupro, como determina a lei." ( trecho do editorial ).
  •             À candidata Dilma Roussef diz que "resvala para o perigoso terreno da hipocrisia e, pior, deixa-se que com um condenável fundamentalismo religioso defina o tom do segundo turno" ( ainda trecho do mesmo editorial ) porque a ela, unicamente, atribui o recomeçar "a campanha com citações do nome de Deus e negação da tese da discriminação do aborto", para concluir: "Curvar-se a este fundamentalismo é trair o princípio da laicidade do Estado, uma conquista do Iluminismo, em um lance de esperteza eleitoreira."
  •             Ponho-me em total divergência.
  •             De plano, e de par com necessários temas pertinentes à educação, saúde, meio-ambiente, habitação, cultura, segurança, transporte e política externa, o tema família, no que se insere a temática do aborto, guarda a mesma dimensão dos outros citados, porque todos dizem respeito à formação e definição da sociedade brasileira, razão de ser do embate político democrático.
  •            A pergunta é: qual sociedade brasileira desejamos construir?
  •            A sociedade funcionalista, do descarte, da pragmática relação custo-benefício, do primado do individualismo exacerbado, do consumo desenfreado, ou a sociedade humanista, da acolhida, da solidariedade, em que a pessoa humana, seja na etapa de vida em que é - embrião, feto, bebê, criança, jovem, adulto, velho - sinta-se amplamente defendida.
  •            Aqui, valho-me de tão correta frase do filósofo Emmanuel Mounier, tão eloquentemente atual:
  •                               "... a grande tentação do século XX será, sem dúvida, a
  •                               ditadura dos tecnocratas, quer da direita, quer da esquer-
  •                               da, que esquecem o homem para só considerar a organi-
  •                               zação" ( O Personalismo - pg. 122 ).
  •            O aborto faz duas grandes vítimas: a mulher-mãe e o nascituro.
  •             "Nenhuma mulher quer abortar" é frase uníssona que ouço em todos os debates de que participei, e participo, seja o posicionamento da mulher, que a diz, contra, ou pró, aborto.
  •             Por quê, então, o Estado brasileiro demite-se e, encorajado e aplaudido pela "mídia iluminista", vai na linha oposta ao desejo da mulher, encorajando-a a abortar?
  •             Por quê cedem tantos, agora sim, às pressões dos poderosos lobbies farmacêuticos, hoje espetacularmente dedicados à manipulação da vida humana?
  •             Opto por viver, e desenvolver a sociedade brasileira, no sentido de que a mulher e a vida em seu ventre, ambas abandonadas, recebam do Estado brasileiro - e este igualmente estimule, incessantemente, o envolvimento de associações e grupos privados - toda a acolhida imprescindível à verdadeira, e não meramente retórica, promoção humana.
  •             Apresento iniciativa concreta, e dela podem servir-se quer quem esteja a postular a Presidência da República, outros cargos executivos, ou qualquer membro do Parlamento: se já temos presente, real e a produzir bons frutos, a lei Maria da Penha, que é protetora da mulher e seus filhos das agressões masculinas de coabitação, o que nos impede de discutir e votar a lei Maria do Abandono, igualmente protetora da mulher e do nascituro, para que a frase dita por todas as mulheres - "nenhuma mulher quer abortar" - nunca mais seja dita e aconteça, então, a vida em plenitude?
  •              É bastante provável que o fundamentalismo de mercado, expressão clara desse iluminismo, assim caolho, só nos faça ver a organização, jamais a pessoa.
  •              Para finalizar: O Estado laico não submete a pessoa à organização, mas, e porque expressão viva da democracia republicana, estimula e garante o livre convívio das pessoas, que o formam, sejam elas de tal, ou qual, confissão religiosa, ou não confessem credo algum.                               

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